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Qua, 14 de Outubro 2020 - 19:16

Escola não é bar

Por: Folha de S. Paulo - Tendências / Debates

 
É ofensivo e leviano atribuir à política as restrições para a volta às aulas
 
Edjane Maria Torreão BritoMédica pediatra e epidemiologista, especialista em saúde pública e em gestão de redes de atenção, é secretária-adjunta da Saúde da Prefeitura de São Paulo
 
Nós, médicos funcionários do SUS há décadas e membros da Vigilância Epidemiológica da cidade de São Paulo desde 1988, auge da luta pelos direitos sanitários que estão refletidos na Constituição, não podemos nos calar: a volta às aulas aumenta a circulação do coronavírus.
 
Atuando como secretária-adjunta da Saúde há três anos e funcionária pública há mais de 30, com dedicação ao SUS na capital paulista, falo em nome da grande equipe de médicos e demais profissionais que compõem nossa assistência e vigilância em saúde. 
 
Nossa vida profissional foi e é dedicada a proteger os cidadãos da maior cidade do Brasil. Estudamos e vivenciamos o controle de epidemias há décadas. Nossa autoridade não se dá apenas pelo conhecimento técnico acadêmico e sólida formação, mas principalmente pela experiência acumulada enfrentando inúmeras epidemias como dengue, febre amarela, H1N1 e sarampo.
 
Desde 10 de janeiro deste ano, antes de a pandemia chegar ao país, já estávamos com uma agenda de capacitação preparando a rede de assistência e vigilância, com mais de mil pontos de atenção. Nossa abnegada equipe, que compõe a autoridade municipal de saúde, sabe mais do que ninguém quais as principais medidas para controlar epidemias gripais nesta megalópole, que tem uma das maiores concentrações de pessoas em condições vulneráveis.
 
Sem desprezar estudos (suecos, dinamarqueses e belgas, dentre outros), também acompanhamos as experiências de França, Reino Unido e Espanha, que vivem nova elevação de casos após o retorno escolar. E nos mantemos conectados com fóruns de cooperação em saúde de grandes cidades. Aqui, graças à confiança do prefeito Bruno Covas (PSDB) em nosso trabalho, priorizando a opinião da equipe técnica, temos um dos melhores desempenhos no controle da disseminação do vírus e na condução da doença.
 
Ouvindo a ciência e resistindo a pressões, legítimas, de setores econômicos, o prefeito tomou medidas rigorosas de restrição de circulação de pessoas quando a transmissão do vírus tornou-se comunitária. Com elas, o apoio da população e o incremento rápido da capacidade da assistência, não houve sobrecarga do sistema de saúde. Achatamos a curva epidemiológica de casos e de óbitos e não vivenciamos exaustão no serviço funerário, o que teria sido caótico em São Paulo.
 
Ofendem-nos, agora, acusações levianas de que a manutenção da restrição para a abertura de escolas, sobretudo dos ensinos infantil e fundamental, tem caráter político, e não técnico. Temos segurança absoluta em afirmar que a reabertura de escolas, neste momento, pode levar a um aumento do número de casos.
 
Pior e mais ofensivo é ter que ouvir sofismas do tipo: se abriram o bar, por que não abrem as escolas? A resposta é simples: escola não é bar.
 
Com a nossa experiência, após análise das fases do inquérito sorológico feito na cidade, podemos afirmar que quase 70% das crianças são assintomáticas, tornando-se possível foco de transmissão silenciosa —e que em torno de 25% delas residem com pessoas idosas, cuja taxa de letalidade ao adquirir a enfermidade é preocupante em todas as classes sociais.
 
As medidas de controle são as mais efetivas e devem ser priorizadas enquanto não há vacina aprovada. Ainda que as escolas estejam preparadas, com protocolos sanitários rígidos, as crianças não são capazes de observá-los integralmente. Volta às aulas envolve movimentação de pessoas —pais, professores, profissionais de transportes, merendeiros—, expondo a todos.
 
Outra questão que merece atenção, ainda pouco compreendida, é a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica. Embora rara, é uma complicação que pode surgir em crianças infectadas. A volta precipitada das aulas presenciais, sobretudo no ensino infantil e fundamental, pode levar à contaminação precoce de pessoas do grupo de risco, com incremento inevitável de óbitos.
 
Existem dezenas de razões para termos recomendado ao prefeito Bruno Covas prudência na volta das atividades escolares —e nenhuma é de cunho político. A volta gradual, apenas para atividades extracurriculares, de caráter voluntário e facultativo, é adequada para o momento epidemiológico atual.
 
A principal razão da correta cautela é o mandamento que deve nortear uma sociedade civilizada: preservar vidas, porque toda vida importa!
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