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Qui, 22 de Novembro 2012 - 14:24

Baixa proficiência de inglês no Brasil expõe deficiências no sistema de ensino

Se nada for feito, os estrangeiros que pretendem vir para a Copa ou para a Olimpíada no Brasil precisarão aprender português.

Por: LOURIVAL SANTANNA - O Estado de S. Paulo - 18.11

"Do you speak English?" Disfarçado de turista estrangeiro, o repórter do Estado fez essa pergunta a 110 pessoas que passavam pela esquina da Avenida Paulista com a Rua Haddock Lobo. Dessas, 22 responderam que sim, e conseguiram explicar em inglês, com diversos graus de fluência, como chegar ao Museu de Arte de São Paulo (Masp), a 500 metros dali. Uma em cada cinco. Isso, num dos pontos do País por onde transita mais riqueza e, com ela, a maior proporção de profissionais liberais e empregados de grandes empresas.

Todos os 88 que responderam "não" aparentavam ter concluído ao menos o ensino médio e, portanto, ter passado no mínimo oito anos tendo duas aulas de inglês por semana. "No, sorry", desculparam-se alguns, antes de emudecer. Dois policiais militares - cuja corporação exige o ensino médio - ficaram olhando, até que um deles balbuciou: "no stand", querendo talvez dizer "we don't understand" (não entendemos). Os que falavam fizeram cursos particulares de inglês e até mesmo intercâmbio nos Estados Unidos e na Inglaterra, e em geral usam o idioma no dia a dia.

A Paulista é um oásis cosmopolita em um deserto monoglota. A Education First (EF), rede mundial de intercâmbio, aplicou, entre 2009 e 2011, exames em 1,67 milhão de adultos interessados em aperfeiçoar seu inglês, em 54 países onde o idioma não é nativo. O Brasil ficou em 46.º lugar, atrás de países como Argentina, Uruguai, Irã, Peru, China, Venezuela e Síria. A nota média obtida pelos brasileiros, 46,86, colocou o País no pior nível, o de "proficiência muito baixa".

De acordo com o relatório da pesquisa, quanto melhor a posição do país no ranking, maior a renda e o valor de suas exportações per capita, maiores os gastos com pesquisa e desenvolvimento, mais usuários de internet por 100 habitantes, mais alto o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), maiores o gasto público com educação e o nível de escolaridade da população. O estudo indica que o conhecimento de inglês está para a economia assim como a infraestrutura.

Luciano Timm, diretor de Marketing da EF no Brasil, observa que grande parte dos trabalhos que resultam no Prêmio Nobel é feita em colaboração. "O cientista só pode colaborar se falar inglês." Esse é também o idioma dos negócios e das relações internacionais, adotado, por exemplo, na União Europeia, apesar de o francês ser a língua nativa do maior número de países membros, a começar pela sua sede, a Bélgica. Timm cita o filósofo austríaco naturalizado britânico Ludwig Wittgenstein: "Os limites da linguagem significam os limites do meu mundo."

O repórter esteve em 35 dos 54 países. Neles, escolas de idiomas não são tão comuns como no Brasil. Quem fala inglês em geral aprendeu no ensino regular.

Ensino

Para o sociólogo Simon Schwartzman, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), a baixa colocação do Brasil no ranking é compatível com outras comparações internacionais, como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), que testa a compreensão de leitura, matemática e ciências. No último exame, divulgado em 2009, o Brasil ficou em 57.º, de um total de 74 países. Há um problema geral de qualidade de ensino.

Dos cerca de 2 milhões de professores do nível fundamental e médio do Brasil, 182 mil ensinam inglês (134 mil na rede pública e 48 mil na particular), segundo o Ministério da Educação. Com duas aulas por semana ao longo de oito anos, "daria para ensinar muita coisa", atesta Vinícius Nobre, presidente do Braz-Tesol, que reúne 2 mil professores da língua. Inglês parece ser uma disciplina de segunda classe. "O inglês entrou no currículo como algo obrigatório, cuja necessidade não era comprovada", analisa Nobre. "É sempre a aula de inglês que é cancelada quando tem reunião de pais ou festa junina."

Kelvin Oliveira, de 17 anos, conta que só começou a estudar inglês na 7.ª série, embora o ensino da língua seja obrigatório a partir da 5.ª. "Na 6.ª série, a professora entrou de licença e não tive nenhuma aula", diz o jovem, que na época estudava em uma escola municipal no Jardim Rodolfo Pirani, no extremo leste de São Paulo. "Na 5.ª, não lembro de ter tido inglês."

Hoje aluno do 3.º ano em uma escola estadual, Kelvin é aficionado pela língua: "Eu sempre quis ver a neve." No ano passado, prestou a seleção para o programa Jovens Embaixadores, do governo americano, que envia estudantes para os Estados Unidos, mas não passou. Em dezembro, graças a sua intimidade com computadores, conseguiu estágio na rede Acessa São Paulo e, com o salário de R$ 390, passou a pagar escola de inglês. Além disso, ingressou no Curso de Inglês Online da Secretaria Estadual de Educação. Resultado: passou em nova seleção dos Jovens Embaixadores e vai ficar três semanas nos EUA em janeiro, começando por Washington. Onde verá muita neve.

Método antiquado e salas cheias explicam dificuldade

No exame anterior da EF, aplicado entre 2007 e 2009, o Brasil obteve nota semelhante à do atual: 47,27, mas ficou em 31.º. Foram os outros países que subiram. A diferença entre os dois exames foi o peso muito maior dado à capacidade de entender o que se ouve. Os especialistas ouvidos pelo Estado concordam que a dificuldade de falar reflete a precariedade de um ensino com métodos antiquados, o foco na teoria, turmas grandes, sem separação dos alunos por nível nem recursos audiovisuais.

O Curso de Inglês Online foi aberto neste ano e já atendeu 50 mil alunos do ensino médio e da educação de jovens adultos. Para 2013, foram abertas 60 mil vagas. Segundo a coordenadora do programa, Ana Carolina Lafemina, o foco é a fala. Os vídeos simulam situações cotidianas de contato do aluno com estrangeiros. "Nossa preocupação é a inserção no mercado de trabalho", disse ela. "A Copa e a Olimpíada criarão oportunidades de trabalho, mesmo que temporário."

Na rede estadual foram introduzidos desde 1987 os Centros de Estudos de Línguas, que hoje somam 226 no Estado, com 150 professores de inglês, espanhol, italiano, francês, alemão e japonês para 6.065 estudantes a partir da 5.ª série - em um universo de 3,14 milhões. Na Escola Estadual Rui Bloem, na zona sul de São Paulo, o curso de inglês tem apenas 23 inscritos, do total de 2 mil alunos. De acordo com as professoras, os estudantes estão mais preocupados em arranjar estágio e emprego ou preparar-se para o vestibular.

Em Xangai, escolas ensinam todas as matérias em inglês

Há uma certa moda de estudar mandarim, dada a ascensão econômica da China, mas os chineses estão aprendendo inglês maciçamente. Apesar da enorme distância entre as duas línguas e do histórico isolamento da China, o país ficou dez posições acima do Brasil no ranking. A Education First normalmente não mantém escolas físicas, mas na China possui uma rede e o país representa uma de suas maiores operações no mundo.

"Muito em breve o mundo falará inglês com sotaque chinês", brinca Luciano Timm, diretor de Marketing da EF. A empresa ensinou inglês para 25 mil pessoas que trabalhariam na Olimpíada de Pequim, em 2008, com vocabulários especializados para cada função, incluindo os árbitros de cada modalidade.

Em Xangai, o principal centro econômico da China, as escolas públicas ensinam todas as matérias em inglês. Em 2006, o valor de mercado das empresas dedicadas à educação em inglês na China era de US$ 131 milhões; neste ano, esse número alcança US$ 505 milhões. No mundo todo, 2 bilhões de pessoas estão aprendendo inglês, segundo o linguista britânico David Graddol.

À diferença de povos como os chineses, japoneses, árabes e russos, por exemplo, os brasileiros não precisam aprender um novo alfabeto para estudar inglês e há mais semelhanças de sons e mesmo de palavras. Além disso, assinala Vinícius Nobre, presidente do Braz-Tesol, os brasileiros têm uma natural facilidade de comunicação.

Mas isso não basta. Se nada for feito, os estrangeiros que pretendem vir para a Copa ou para a Olimpíada no Brasil precisarão aprender português.

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