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Qua, 27 de Maio 2015 - 23:01

Educação na paulada

Em vez de ouvidos, professores em greve são agredidos e intimidados

Por: Revista Carta Capital - 11.05

Há seis anos, Marcio de Almeida Ramos deixou o Rio de Janeiro para viver em Colombo, região metropolitana de Curitiba. Como lembrança das origens, tatuou no braço direito a figura do Cristo Redentor. Por causa desse desenho, sua família o reconheceu entre as mais de 200 vítimas da Polícia Militar do Paraná ao vê-lo, pelas redes sociais, ser transportado numa maca pelos corredores da prefeitura de Curitiba, convertida em Pronto-Socorro improvisado. Ramos é Professor de Geografia e em 29 de abril participava das manifestações contra o governador tucano Beto Richa. Uma bomba atingiu uma perna e marcas dos estilhaços ainda são visíveis em seu rosto. Do incidente lembra-se apenas dos efeitos do gás lacrimogêneo. "Só após ser atendido comecei a entender o que ocorreu."

Na terça-feira 5, o Professor era mais um entre os cerca de 20 mil servidores que marcharam pelas ruas da capital paranaense para depositar flores nas grades da Assembleia Legislativa.

Desta vez, os policiais se mantiveram afastados. Não houve tumulto. Horas depois, em assembleia realizada no estádio de Vila Capanema, 8 mil Docentes da rede estadual decidiram manter a paralisação iniciada em 25 de abril. Os grevistas aguardam uma nova rodada de negociações com o governo para discutir a data-base. Pedem um reajuste de 8,4%, baseado no IPCA, índice oficial de preços, dos últimos 12 meses. O Estado oferece 5,4%.

Para Walkíria Olegário Mazeto, secretária educacional do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná, o conflito foi o desfecho de um processo de sucateamento da Educação pública estadual. A começar pela escolha do secretário, o engenheiro Fernando Xavier Ferreira. "Ele não tem o menor conhecimento do que seja Educação pública. Seu raciocínio é linear, financeiro e os resultados se resumem a custo-benefício." Executivo com passagens por diversas empresas de telefonia, Ferreira participou da formatação do modelo de privatização das teles a convite de Sérgio Motta, ex-ministro das Comunicações de Fernando Henrique Cardoso.

Entre as medidas adotadas pelo então secretário está o encerramento de 2,2 mil turmas, notadamente nas áreas rurais, o que superlotou as salas de aula. Ferreira decretou ainda o fim dos projetos de contraturno Escolar e de atividades curriculares complementares para os Alunos, além de dispensar 33 mil servidores temporários, entre Professores, pedagogos, auxiliares de serviços e técnicos administrativos. "Foi um caos. Não havia funcionários suficientes para cuidar do dia a dia nas Escolas", diz Mazeto.

O estopim para a greve ocorreu em fevereiro, quando Richa encaminhou um pacote de maldades à Assembleia Legislativa, com a subtração de uma série de direitos incluídos no plano de cargos e salários dos Professores, entre eles o "quinquênio" adicional incorporado a cada cinco anos de trabalho. No mesmo pacote, propôs a transferência de cerca de 8,5 bilhões de reais da Previdência estadual para o caixa do governo. Manifestantes ocuparam a Assembleia por quase uma semana. Diante da pressão, o tucano retirou os projetos e recontratou 20 mil temporários . Em abri, voltou, no entanto, a insistir nas mudanças do sistema previdenciário. Ao som das bombas da PM, os deputados aprovaram o projeto por 31 votos a 21.

Em solidariedade, Professores da rede pública de 16 estados cruzara m os braços em 30 de abril. "Não se pode bater em quem educa nossos filhos", criticou o ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro. Até mesmo o presidente do PSDB no Paraná, Valdir Rossoni, usou as redes sociais para condenar os excessos da ação policial. Alvo do fogo amigo, o secretário estadual de Segurança. Fernando Franceschini, culpou a PM. A reação não tardou. Na quarta-feira 6, em carta assinada por 16 dos 19 coronéis, Cesar Vinícius Kogut. comandante-geral da tropa, disse que o secretário foi alertado "inúmeras vezes" sobre os possíveis desdobramentos da ação. Na quinta 7, Kogut pediu exoneração. Enquanto Franceschini aferra-se ao cargo, o secretário de Educação decidiu pedir demissão "por razões pessoais"

Além do Paraná, as greves persistem em São Paulo, Santa Catarina e Pará. Em Pernambuco, acuados por pesadas multas impostas pela Justiça, os Educadores suspendera temporariamente a para isação após 24 dias. A pausa servirá para retomar as negociações. "Vários governos só ofereceram reajustes para quem está no início da carreira, uma forma deturpada de cumprir a Lei do Piso", diz Marta Vanelli, secretária-geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.

Instituído por lei federal, o piso nacional para uma jornada de 40 horas foi reajustado neste ano para 1.917 reais, alta de 13,01%. Pernambuco concordou em oferecer esse porcentual apenas aos Docentes com Ensino médio, cerca de 10% do total de 49 mil Professores da rede. Profissionais com licenciatura plena e dez anos de serviço teriam direito a 0,89%. Os demais não receberam qualquer oferta. "Destruíram a nossa carreira. Logo mais, todos estarão nivelados pelo piso" queixa-se Marinalva Lourenço, secreta ria--geral do sindicato estadual.

Em Santa Catarina, os professores reivindicam um reajuste de 13,01% para toda a categoria, e não apenas para quem está na linha do piso. "Da forma como está, um recém-contratado e um Professor com nove anos de experiência recebem o mesmo salário-base" lamenta Luiz Carlos Vieira, presidente do sindicato estadual. O secretário de Educação, Eduardo Deschamps, alega ser impossível estender o reajuste de catarinenses. "O piso nacional cresceu 76% nos últimos quatro anos, muito acima da inflação ou da valorização do salário-mínimo",diz o gestor, também presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Educação. "O critério usado para o reajuste do piso é insustentável a longo prazo. Ou mudamos a forma de calculá-lo ou precisaremos criar novas fontes de financiamento."

Segundo o Plano Nacional de Educação, o Brasil tem até 2020 para equipar os rendimentos dos Professores à média dos demais profissionais com Ensino superior. A meta parece, no entanto, um sonho distante. "A Lei do Piso melhorou os salários iniciais, mas identificamos uma tendência de achatamento ao longo da carreira" diz Maria Dilneia Espíndola Fernandes, Professora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e coordenadora de uma pesquisa nacional sobre a remuneração Docente, cujos resultados serão apresentados em 2016.

Pioneira, a Apeoesp, sindicato dos Professores paulistas, passou a cobrar do governo a equiparação dos salários dos Docentes com a média dos servidores de São Paulo com Ensino superior. Pelos cálculos da entidade, seria necessário um aumento real de 75% nos próximos cinco anos para cumprir a meta. "É evidente que não esperamos receber isso de uma só vez. Mas exigimos que o governo apresente um plano", diz a presidente da Apeoesp, Maria Izabel Noronha. Parados desde 13 de março, os grevistas só foram recebidos em duas audiências pelo governo. Não ouviram propostas.
Nos rankings internacionais, o Professor brasileiro figura entre os menos valorizados. Segundo o relatório Education at a Glance 2014, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil paga 10.375 dólares por ano a um Docente em início de carreira nas Escolas públicas de Ensino fundamental. É um terço do valor médio nas nações desenvolvidas da OCDE. Até mesmo países latino-americanos como Chile e México pagam mais.

A desvalorização dificulta a atração de profissionais qualificados para a carreira Docente. Segundo o Censo Escolar de 2013, um quarto dos mais de 2 milhões de Professores da Educação básica não possui diploma de Ensino superior. Nos anos finais do Ensino fundamental, apenas 32,8% têm licenciatura na área em que atuam. No Ensino médio, são 48,3%.

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