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Sex, 30 de Julho 2021 - 15:03
Professores e alunos da rede estadual de ensino foram largados à própria sorte pelo governo do Estado durante o período do ensino remoto.
A pesquisa que aqui publicamos, realizada pela Vox Populi, por solicitação da APEOESP, apontou que professores, estudantes e pais não tiveram apoio do poder público para desenvolver as aulas remotas.
As aulas virtuais foram reprovadas pela comunidade escolar - professores (66,9%), pais (74,7%) e alunos (73,9%), mas, mesmo assim, 85,6% dos professores, 81,8% dos pais e 76,1% dos alunos têm medo da contaminação pela Covid-19 no retorno precipitado às aulas presenciais.
Para os professores, houve mais trabalho, segundo 49,2% dos entrevistados, chegando a jornadas de até 10 horas. Em contrapartida, os alunos estudaram menos segundo os pais (87,3%), o que foi confirmado pelos estudantes do ensino médio: 84,1% declaram ter se dedicado menos às aulas virtuais. Na média, os pais afirmam que seus filhos estudaram apenas 2,5 horas por dia.
O estudo demonstra que a falta de apoio do governo estadual foi a responsável por essa aparente contradição. Menos da metade dos professores teve treinamento mínimo para dar aulas pela internet e precisaram se reinventar para transmitir os conteúdos aos estudantes. O resultado foi uma jornada de trabalho maior, sem remuneração adequada – pois nossos salários estão congelados, quase 30% abaixo do piso salarial nacional - enquanto os estudantes, sem equipamento ou acesso à Internet, ficaram menos tempo em aula, com prejuízo claro à sua formação.
Segundo a pesquisa, mais da metade dos entrevistados declaram que não receberam do poder público infraestrutura física para trabalharem ou estudarem remotamente, como equipamentos de Tecnologia da Informação, pacote de dados para acesso à Internet ou mesmo help desk do governo ou da escola para as aulas remotas. Entre os pais dos estudantes, essa reclamação chega a 73,8%, ou seja, dois terços. Entre os do ensino médio, 63,2% também não tiveram este apoio. Entre os professores, 54,3%. Ainda segundo os pais, 15,1% dos filhos deixaram de estudar por falta de acesso à Internet ou por necessitarem trabalhar e ajudar na renda da família.
As dificuldades também estiveram nas unidades escolares, sem estrutura para aula remota. Segundo 50,5% dos professores ouvidos, em plena era da tecnologia, as escolas onde trabalham não têm salas com acesso à internet, computadores ou câmeras de vídeo disponíveis para as aulas. Este índice sobe para 70,2% na percepção de pais e 61,5% na avaliação dos estudantes do ensino médio.
Aulas pelo celular
Entre os estudantes de ensino médio, 42,5% não têm acesso a computadores. A grande maioria (94%) teve disponível o celular para acompanhar as aulas virtuais, muitas vezes compartilhado com outro membro da família.
A situação da escola pública no Estado de São Paulo já era precária antes da pandemia, que só escancarou o problema. Precisamos de uma revolução para recuperar o déficit educacional que já existia e piorou com a pandemia. E qual é o planejamento do governo para isso? Ninguém sabe.
A pesquisa ouviu 3.600 pessoas em todo Estado, entre professores (1.500), pais (1.500) e estudantes de ensino médio (600), entre junho e julho deste ano. O estudo tem recortes por capital, região metropolitana e interior, e também por níveis de ensino - educação infantil, ensino fundamental e médio. O objetivo foi levantar os impactos da pandemia na educação pública.
Mais da metade de professores e pais são contra o retorno à aula presencial
Com relação ao retorno à sala de aula neste momento da pandemia, 56,2% dos professores são contra, sendo que, na capital paulista, este índice sobe para 77,5%. Entre os pais, não querem o retorno 51,3% e, entre os jovens de ensino médio, 44,1% também desaprovam. O medo de contrair a Covid no retorno, porém, é praticamente unânime. Em média, 80% dos entrevistados confirmam o receio.
Na percepção da comunidade escolar, o governo não tem dado apoio adequado para o retorno às aulas presenciais. Apenas 25,3% dos professores, 21% dos pais e 39,7% dos alunos do ensino médio dizem que há apoio público. A maioria concorda que o apoio do governo não existe ou é insuficiente.
A Secretaria de Estado da Educação, apesar de ter determinado a volta no dia 2 de agosto para todos os professores às escolas da rede estadual, não divulgou um plano de adaptação das unidades escolares aos protocolos sanitários seguros e nem um planejamento pedagógico para recuperar o déficit de aprendizagem dos estudantes.
Não faltam recursos para tanto. O orçamento do Estado para a educação, em 2021, é de R$ 35,4 bilhões, sendo R$ 12 bilhões para investimentos. Apesar disso, a realidade hoje das escolas é falta até mesmo de papel higiênico. Segundo estudo da seção paulista do Instituto dos Arquitetos do Brasil, em conjunto com o DIEESE, atendendo solicitação da APEOESP, 82% das escolas da rede pública estadual não têm mais do que dois banheiros para os alunos. Como fazer um retorno seguro nestas condições?
De acordo com a pesquisa Vox Populi/APEOESP, para professores ainda há o problema da imunização contra a Covid: apenas 44,6% dos docentes tomaram as duas doses da vacina e 5,5% ainda não tomaram nenhuma dose. Boa parte dos docentes também depende do transporte público para chegar ao trabalho.
Com tanta insegurança, o medo de contrair a Covid-19 é inevitável, sendo mais forte entre professores (85,6%) e pais (81,8%). Os alunos do ensino médio demonstram menos receio de contaminação, mas mesmo assim o medo prevalece para 75,1%.
Professor trabalha mais enquanto aluno estuda menos
Os professores trabalharam mais no ensino remoto, com jornadas de até mais de 10 horas diárias, sem remuneração adequada, enquanto os alunos estudaram menos. Ao mesmo tempo, a escola não conseguiu dar apoio aos professores e aos alunos para incentivar a sua participação nas aulas remotas e evitar a queda no aprendizado e a evasão escolar.
Segundo os dados da pesquisa que agora disponibilizamos, 49,2% dos professores afirmam que trabalham mais dando aulas pela Internet. Na Região Metropolitana de São Paulo, o número de professores que lecionou além da sua jornada é ainda maior: 67,3%. Por nível escolar, os docentes do ensino médio foram os que mais fizeram horas extras: 53,9%.
Em contrapartida, os estudantes não estudaram mais. Segundo 87,3% dos pais e 84,1% dos alunos de ensino médio, as horas dedicadas ao estudo foram menores do que o normal. Ainda entre os pais, 51,1% afirmaram que os filhos ficaram apenas de 2 a 3 horas na aula por dia, e 24,3% só 1 hora.
O acompanhamento educacional pela escola, que colaboraria para atrair o interesse do estudante, não funcionou. Professores (83,2%), pais (69,8%) e alunos do ensino médio (64,9%) afirmam que o acompanhamento do desempenho dos estudantes pela escola foi insuficiente. O suporte, quando existiu, foi feito pelo WhatsApp pelo número privado do professor ou por meio de ligações telefônicas da escola avisando a data para buscar material didático, mas em índices muito baixos.
O resultado é um prejuízo enorme ao desempenho dos estudantes, na opinião da maioria dos professores (65,6%), pais (63,5%) e alunos do ensino médio (62,6%).
Os resultados da pesquisa são claros: professores, pais e estudantes foram totalmente abandonados neste processo. Cabe ao governo do Estado, no mínimo, apresentar um plano consistente de recuperação da aprendizagem. Mas, até agora, não se tocou no assunto. Há uma pressa para o retorno às aulas presenciais, porém, sem qualquer planejamento.
Nossa prioridade segue sendo a defesa incondicional da vida. Aprendizagem se recupera. Vidas não!
Maria Izabel Azevedo Noronha – Professora Bebel
Presidenta da APEOESP
PRINCIPAIS CONSTATAÇÕES EM NÚMEROS
Perfil dos entrevistados
Entre os 1.500 professores entrevistados, 77,9% são mulheres e 22,1% são homens, 94,7% têm nível superior, a maioria tem entre 41 e 50 anos (47,5%) e trabalha como professor entre 6 e 10 anos (43%). A renda familiar dos docentes é de 3 a 5 salários mínimos (43,9%), 48,3% só atua na rede estadual de ensino e 64,5% trabalha em apenas uma escola.
Entre os 1.500 pais de alunos entrevistados, 80,8% são mulheres e 19,2% são homens, 59,9% tem o ensino médio completo ou incompleto, a maioria tem entre 31 e 40 anos (43,2%) e renda familiar de até 2 salários mínimos (43,8%). Os filhos de mais da metade (51,1%) está no ensino fundamental 1 (1º ou 5º ano) e 38% no segundo ciclo (6º ao 9º ano).
Entre os 600 alunos do ensino médio, 53,5% são mulheres e 46,5% são homens. As idades variam de 15 a 17 anos e 57,6% apenas estudam. A renda familiar vai de 1 a 2 salários mínimos.
Afirmam que aulas são piores no ensino remoto
66,9% dos professores
74,7% dos pais
73,9% dos alunos do ensino médio.
Ensino foi prejudicado para
65,6% dos professores
63,5%, dos pais
62,6% dos alunos do ensino médio.
Medo de pegar Covid no retorno às aulas presenciais
85,6% dos professores
81,8% dos pais
75,1% dos alunos
Contra retorno às aulas presenciais
56,2% dos professores, sendo 77,5% na capital paulista
51,3% dos pais
44,1% dos estudantes de ensino médio
Não receberam infraestrutura física para a aula remota (equipamentos de TI, pacote de dados para acesso à internet ou mesmo help desk)
53,3% dos professores
73,8% dos pais de alunos
63,2% dos alunos de ensino médio
Mais trabalho, menos estudo
49,2% dos professores do estado trabalharam mais
67,3% dos professores da RMSP trabalharam mais
53,9% dos professores do ensino médio trabalharam mais
87,3% dos pais afirmam que filhos estudaram menos
84,1% dos alunos de ensino médio