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Qua, 20 de Setembro 2017 - 17:08

Historiador analisa em doutorado contestação e juventude no rock dos anos 80

Por: Ana Maria Lopes

 
 
A juventude, foco do doutorado em História Social de Daniel Cantinelli Sevillano, já estava presente no mestrado do pesquisador, defendido em 2010. "Pro dia nascer feliz? Utopia, distopia e juventude no rock brasileiro na década de 1980" é o tema da tese de doutorado desenvolvida na USP, que aborda as letras politizadas das bandas surgidas, principalmente, em São Paulo e Brasília naquela década.
 
Historiador formado pela Unicamp, Sevillano mostra em sua pesquisa como as composições do Legião Urbana, Ira, Capital Inicial, Titãs e outras bandas retratam os sonhos com a redemocratização do País, as crises econômicas e a perda de ilusões dos jovens que cresceram na ditadura e encontraram no rock um canal de expressão de suas angústias.
 
No mestrado "Somos os filhos da revolução", apresentado em 2010, o pesquisador já havia estudado os movimentos sociais e estudantis, entre os anos de 77 e 85. Nas duas pesquisas, a contestação e a música andam juntas.
 
Para Sevillano, o rock exerceu o papel que foi da MPB na década de 60, de canal de expressão da juventude mais politizada. A tese foi elaborada a partir dos conceitos de utopia e distopia.
 
“Na utopia, se pensa uma ideia de comunidade para o Brasil e como ele vai se desenvolver. Com a posse de José Sarney como presidente da República, em 1985, o País entra no caos econômico e os sonhos se desfazem: é a distopia, fase que vai até 1989", analisa Sevillano.
 
Nos capítulos iniciais da tese de 286 páginas, o historiador analisa a trajetória do rock no Brasil, entre 1955 e 1976, e o papel precursor do punk, entre 1975 e 1982.
 
No início dos anos 1980, aparecem os primeiros sucessos de Blitz, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso e Titãs . “Eram letras sobre o culto ao prazer e à liberdade, mais melódicas e ingênuas", explica o pesquisador.
 
Em 1985, duas das bandas mais icônicas da época lançaram seus primeiros discos. Em São Paulo, o Ira lançou "Mudança de Comportamento" e, em Brasília, Legião Urbana lançou-se com um disco homônimo, com músicas que tornaram-se hinos para os jovens da década pós-ditadura, "Geração Coca Cola" e "Soldados".
 
"As letras das bandas de Brasília e de São Paulo eram um pouco mais politizadas e havia uma grande influência do movimento punk, dos anos 1970. Em São Paulo, principalmente na periferia, havia ainda mais contestação social", defende o historiador.
 
Daniel Cantinelli destaca em sua pesquisa letras, que impressionam pela atualidade. Composta ainda na década de 70, "Conexão Amazônia", do terceiro disco do Legião, "Que País é Esse", lançado em 1987, foi censurada. "Os tambores da selva já começaram a rufar / a cocaína não vai chegar", cantava o Legião.
 
Na faixa título, Renato Russo protestava: "Nas favelas do Senado, sujeira pra todo lado / Ninguém respeita a Constituição / mas todos acreditam no futuro da nação”.
 
Os versos de "Selvagem", que os Paralamos do Sucesso lançaram em 1986, também são representativos dos problemas sociais e políticos que atravessam gerações no Brasil: "O governo apresenta suas armas / Discurso reticente, novidade inconsistente / E a liberdade cai por terra / Aos pés de um filme de Godard”.
 
"Nesta música há uma clara referência à censura do governo Sarney, que proibiu a exibição do filme Je Vous Salue, Marie, de 1985, do diretor franco-suíço Jean-Luc Godard, em uma demonstração de que a censura parecia ser mais moral do que política”, explica o pesquisador, que destaca ainda outro disco de 1986 em sua pesquisa.
 
"Cabeça Dinossauro", terceiro disco dos Titãs, traz a contestação social e política em quase todas as suas faixas: Polícia, Estado Violência, Homem Primata, etc.
 
A tese de Daniel Cantinelli Sevillano é concluída com uma análise da letra 1965 (Duas Tribos), que está no álbum "As Quatro Estações", lançado pelo Legião Urbana em 1989. Trata-se de uma composição repleta de símbolos infantis da década de 60 e 70.
 
É como se a utopia de 'País do Futuro' fosse descaracterizada por Renato Russo, que traz nesta canção elementos do passado para falar do País. “Tinha arma de verdade / Tinha arma nenhuma / Tinha arma de brinquedo /Eu tenho autorama / Eu tenho Hanna-Barbera / Eu tenho pêra, uva e maçã / Eu tenho Guanabara / E modelos revell / O Brasil é o país do futuro” são os irônicos versos da canção.
 
"A distopia oresente no discurso e nas ações das bandas de rock brasileiro do período refletia a desilusão desse grupo de jovens, que celebraram o fim da ditadura, mas que não tinham o que comemorar em termos reais. A mudança almejada por tanto tempo mostrará-se uma promessa sem fim, uma iluisão que o próprio cotidiano tratava de descontruir", conclui Sevillano.
 
SERVIÇO: "Pro dia nascer feliz? Utopia, distopia e juventude no rock brasileiro na década de 1980" , de Daniel Cantinelli Sevillano, está na Biblioteca Digital da USP:
ww.teses.usp.br. Contatos com o autor, através do e-mail: dcsevillano@gmail.com
 
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